Camarões feito na hora - Pearl S. Buck

A Flor Oculta
Pearl S. Buck
1952
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Por sorte o restaurante ficava perto e o carro parou. Kobori pagou, dando uma gorjeta exagerada, e saíram. Gostaria de conduzir Josui pelo braço como via os americanos fazerem com as senhoras que acompanhavam, mas para isso era acanhado de mais. Entrou no local, pequeno mas bastante dispendioso, onde já reservara uma mesa e escolhera almoço. Era um restaurante crioulo, especializado em pratos de Nova Orleães, pois, embora Kobori tivesse preferido um restaurante japonês, com bons pratos japoneses, achara melhor não manifestar essa preferência enquanto não conhecesse o modo de pensar de Josui.

A mesa ficava ao lado de uma janela com vista para a baía; a toalha era branca, a prata polida e os pratos muito limpos. Tudo estava impecável e sobre a mesa havia flores que ele comprara, àsteres roxo-pálidos e lantanas cor de limão.

Kobori reclinou-se na cadeira, um pouco pequena para ele, e pela primeira vez sentiu-se alegre e à vontade.

- Agora disse - terá de comer o que eu encomendei. É considerada a melhor comida crioula. Não difere muito da dos países asiáticos, embora seja mais condimentada que a nossa.

- Estou com fome - confessou Josui. - O apetite voltou desde que deixei de me sentir triste.

Ele gostou de ouvir aquilo e abriu a boca num sorriso largo. Depois lembrou-se da notícia que, por honestidade, devia transmitir-lhe. Mas decidiu esperar até vir a sopa. Naquele momento o criado trazia a terrina de prata, não muito grande, duas tigelas e a concha. Servidas as tigelas, os dois entreolharam-se, ele convidou-a a comer e comeram a sopa em silêncio. Tinham aprendido ambos que não se desvia de um bom prato a atenção do convidado ou do anfitrião.

Houve, no entanto, uma longa pausa até que o prato seguinte fosse servido.

- Os camarões, que vão ser o prato principal, não podem ser preparados com antecedência - explicou Kobori.

- Não estamos com pressa, pois não? - tornou Josui.

- Não - respondeu ele. Passou o guardanapo de linho branco pelos lábios. Clareou a voz. - Para ser franco, gosto até deste intervalo. Tenho uma notícia para si. Não sei se vai considerá-la boa.

- Notícia? - repetiu Josui. Pensou logo em Allen. Mas que notícia poderia vir dele? Que talvez fosse de seus pais.

- Nestes últimos quinze dias - disse com cuidado, para facilitar-lhe a compreensão - vim a saber que os juízes do tribunal deste Estado da Califórnia decidiram que as pessoas de cor branca podem casar com japoneses.

Fitou-a com um olhar profundo e penetrante. Ela compreendeu a pergunta apaixonada que havia nos seus olhos e retribuiu-lhe serenamente o olhar.

- Que significa isso para mim? - perguntou.

- Achei que devia saber. Pensei que talvez fizesse diferença para si. Quero dizer, se assim o deseja, poderá transmitir essa notícia ao americano cujo nome não desejo pronunciar. Agora será possível viverem juntos aqui.

- Não é possível vivermos juntos em parte alguma retorquiu ela. - Já não é possível.

Kobori sentiu o coração pesar-lhe no peito e diminuir as pulsações. Podia sentir as contracções do músculo compacto.

- Quer dizer que não o deseja?

- Não se trata de um desejo -redarguiu ela com voz tranquila. - Trata-se de uma impossibilidade. - Depois perdeu um pouco da sua calma. - Não vê, Kobori, que não posso? A lei já não importa. Conheço-o agora como ele é na realidade. E não basta para uma vida Inteira.

O coração de Kobori começou a bater fortemente.

- Quer dizer que já não sente...

Josui terminou a frase por ele.

-Amor? Talvez não... talvez sim. Mas isso também não importa. O amor não é suficiente. Pelo menos para mim. Talvez seja suficiente para os americanos, mas para mim não é. Sei agora.

Ele respirou profundamente, com ruído.

- Isso quer dizer que vai regressar ao Japão?

- Sim, Kobori, do mesmo modo que meu pai.

Naquele instante o criado apareceu inesperadamente, trazendo uma bandeja sobre a qual estava um belo prato de camarões. Colocou-o diante de Kobori, com orgulho, apresentando-lhe a colher e o garfo.

- Monsieur, quererá servir pessoalmente Madame - disse.

Kobori, apanhado de surpresa, pegou nos talheres desajeitadamente, depois olhou desorientado para Josui.

- Nunca fiz isto em toda a minha vida.

- Com licença. - josui estendeu as mãos delgadas e pegou, rápida e graciosamente, no garfo de prata e na colher rasa. Era hábil e tinha paciência. - Dê-me o seu prato, Kobori. Vou servi-lo.

Cheio de gratidão, ele estendeu-lhe o prato.

- Muito obrigado - murmurou. "Que sorte”, pensou enquanto a observava, "ter guardado as pérolas rosadas, legítimas, da India", e com voz carinhosa disse: - Embora eu a tenha convidado, você sabe fazer tudo melhor do que eu.

Ela sorriu sem responder. Achava muito natural servir aquele homem grande e desajeitado. E sentiu que o faria pelo resto da sua vida.

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A Flor Oculta é uma bela e pungente história de amor, cujos protagonistas - uma japonesa e um americano - vivem um drama intenso e doloroso. Mas, das ruínas do amor aniquilado pelos preconceitos, brota a "flor oculta", o pequeno Lennie, que vai encontrar, à sua volta, a dádiva generosa da mais profunda simpatia humana.