Casa de chá e samosas - Aravind Adiga

Entre Assassinatos
Aravind Adiga
2011
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NENHUM OUTRO LOJISTA NO ENTORNO DA estação contrataria um muçulmano, mas Ramanna Shetty, dono da Ideal Store, uma lanchonete que serve chá com samosas, disse a Ziauddin que ele podia ficar.
Desde que prometesse trabalhar firme. E que ficasse longe de qualquer safadeza.
O molequinho, coberto de poeira, largou sua bolsa no chão; ergueu uma das mãos junto ao peito.
— Eu sou muçulmano, senhor. Nós não fazemos safadeza.
Ziauddin era pequeno e negro, tinha bochechas gorduchas de neném e um sorriso travesso que expunha dentes grandes e brancos como os de um coelho. Ele fervia chá para os clientes numa enorme chaleira esburacada de aço inoxidável, observando, com uma concentração feroz, a água fervilhar, transbordando e chiando ao acertar a chama de gás. De tempos em tempos, Ziauddin metia a mão numa das velhas caixas de aço inoxidável que tinha ao seu lado para jogar na mistura o pó de chá preto, ou um punhado de açúcar branco, ou um pedaço de gengibre amassado. Ele chupava os próprios lábios, prendia a respiração e, com o antebraço esquerdo, inclinava a chaleira, despejando o conteúdo num coador: o chá quente gotejava pelos poros entupidos, caindo em copinhos finos e longos acomodados nos espaços de uma caixa de ovos.
Levando os copos um a um para as mesas, ele encantava os homens brutos que frequentavam a casa de chá, interrompendo suas conversas com gritos de “É um! É dois! É três!”, batendo os copos na mesa à frente deles. Mais tarde os homens o viam agachado ao lado da loja, lavando pratos numa grande bacia cheia de uma água imunda; ou envolvendo samosas engorduradas em folhas arrancadas de livros escolares de trigonometria, para serem entregues em domicílio; ou retirando com uma colher a massa viscosa de folhas de chá do coador; ou apertando, com uma chave de fenda enferrujada, um parafuso solto no encosto de uma cadeira. Quando alguém dizia uma palavra em inglês, o trabalho se interrompia: ele se virava e a repetia a todo volume (“Sunday-Monday, Goodbye, Sexy!”), e a lanchonete inteira caía na gargalhada.
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Este é novo romance do autor de O Tigre Branco, o aplaudido Booker Prize de 2008. A obra desenvolve-se como um um guia de viagem a uma cidade imaginária, Kittur, situada na costa sudoeste da Índia, a meio caminho entre Goa e Calecuta, durante o período de sete anos que decorreu entre os assassinatos de Indira Gandhi e do seu filho Rajiv. São catorze histórias que se sobrepõem formando um mapa vivo da cidade, decorrendo cada uma em diferentes zonas de Kittur. Aravind Adiga retoma muitos dos temas presentes em O Tigre Branco, mas recorre agora a múltiplos narradores diferentes. Uma obra que o conduz à descoberta fascinante da Índia actual.