Receita de Arancini (bolinho de risoto) - Andrea Camilleri


O ano-novo de Montalbano

Andrea Camilleri

2009

Jesus, os arancini de Adelina! Montalbano os experimentara apenas uma vez: uma lembrança que seguramente lhe entrara no DNA, no patrimônio genético.

Adelina levava dois dias inteirinhos para prepará-los. Sabia a receita de cor. Na véspera, você faz um guisado de vitelo e porco em partes iguais, que deve ser cozido em fogo lentíssimo por horas e horas, com cebola, tomate, aipo, salsa e manjericão. No dia seguinte, prepare um risoto, aquele que chamam à milanesa (sem açafrão, por misericórdia!), espalhe em cima de uma mesa, amasse com alguns ovos e deixe esfriar. Enquanto isso, cozinhe umas ervilhas miúdas, faça um molho bechamel, pique em pedacinhos algumas fatias de salame e faça um mexido disso tudo com a carne guisada, triturada a mão com uma faca meia-lua (nada de liquidificador, pelo amor de Deus!). O caldo da carne você mistura com o risoto. Aí é só pegar um pouquinho de risoto, encaixar na palma da mão em concha, meter ali dentro mais ou menos uma colher do mexido, cobrir com mais risoto e ajeitar pra formar uma bela bolota. Cada bolota é passada em farinha de trigo, depois em clara de ovo e farinha de rosca. Então jogue todos os arancini numa panela de azeite fervendo, e frite até pegarem uma cor de ouro velho. Escorra em cima de um papel. Pronto, já pode comer, agradecendo ao Senhor!

Montalbano não teve dúvidas quanto ao lugar onde cearia na noite de Ano-Novo. Só uma pergunta o deixou angustiado, antes de adormecer: os dois delinquentes filhos de Adelina conseguiriam ficar em liberdade até o dia seguinte?

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"O Ano-Novo de Montalbano", de Andrea Camilleri, reúne contos protagonizados pelo comissário Salvo Montalbano, investigador siciliano perspicaz e amante da boa mesa, que enfrenta casos criminais e dilemas éticos no cenário social da Sicília. Entre humor e melancolia, o livro destaca episódios como a defesa do filho da diarista injustamente acusado, revelando o olhar crítico e compassivo do autor sobre as injustiças cotidianas. Camilleri (1925–2019), escritor e roteirista siciliano radicado em Roma, tornou-se célebre pela criação de Montalbano, personagem que o consagrou internacionalmente como um dos grandes nomes da literatura policial contemporânea, marcada por realismo, crítica social e ironia.

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Arancini de Adelina

Receita siciliana segundo a memória de Montalbano


Ingredientes

Para o guisado (preparado na véspera):

  • 250 g de vitelo moído grosso

  • 250 g de carne de porco moída grossa

  • 1 cebola média picada

  • 2 tomates maduros picados

  • 1 talo de aipo picado

  • Salsinha e manjericão a gosto

  • Azeite de oliva

  • Sal e pimenta a gosto

Para o risoto:

  • 2 xícaras de arroz arbório

  • Caldo do guisado (reservado)

  • 2 ovos

  • Sal a gosto

Para o recheio:

  • 1 xícara de ervilhas miúdas cozidas

  • 1 xícara de molho bechamel

  • 4 fatias de salame picadas

  • Guisado triturado manualmente com faca meia-lua

Para empanar e fritar:

  • Farinha de trigo

  • Claras de ovo

  • Farinha de rosca

  • Azeite para fritar


Modo de preparo

1. O guisado (véspera)
Em uma panela, aqueça o azeite e refogue a cebola.
Junte as carnes, o tomate, o aipo, a salsa e o manjericão.
Cozinhe em fogo baixíssimo por horas, até obter um guisado espesso e perfumado.
Reserve o caldo, que será usado no risoto.

2. O risoto (no dia seguinte)
Prepare um risoto simples, “à milanesa” — mas sem açafrão, por misericórdia!
Use o caldo da carne no lugar do caldo comum.
Quando estiver pronto, espalhe o risoto sobre uma mesa, misture os ovos e deixe esfriar.

3. O recheio
Pique o salame e misture com as ervilhas, o bechamel e a carne guisada triturada à mão (nada de liquidificador!).

4. Montagem dos arancini
Pegue uma porção de risoto e abra na palma da mão em concha.
Coloque uma colher do recheio no centro e cubra com mais risoto, formando uma bolota firme.
Repita até acabar a massa e o recheio.

5. Empanar e fritar
Passe cada bolota na farinha de trigo, depois na clara de ovo e, por fim, na farinha de rosca.
Frite em azeite bem quente até que fiquem com cor de ouro velho.
Escorra sobre papel absorvente.


Para servir

Sirva quente.
Coma agradecendo ao Senhor — e a Adelina, por sua santa paciência de dois dias.