Almoço na casa da vovó Thunder - romance 'A casa redonda' de Louise Erdrich

Almoço na casa da vovó

Entramos na casa da vovó e é claro que o bife já estava na frigideira, com uma cebola. O cheiro teve um efeito maravilhoso e minha barriga roncou. Eu queria pegar qualquer coisa que pudesse enfiar na boca. Havia uma pilha de sanduíches de geleia em cima da mesa, para darmos uma forrada. Comi um. Ela estava de costas, diante do fogão, e em cima da mesa havia uma tigela de pequenas maçãs secas e doces. Tinha uma macieira atrás do prédio dos idosos e vovó sempre colhia as maçãs. Colhia todas as maçãs da árvore, cortava-as em fatias finas e as colocava para secar no forno, cobrindo as fatias com açúcar e canela. Comi mais um sanduíche de pão branco com geleia. Ela tinha colocado os pratos na mesa e toalhas de papel em cima deles, para absorver a gordura das rabanadas.

Wiisinig, comam, disse ela sem se virar.

Peguei umas fatias de maçã e pus sobre a língua. Olhei para Cappy. Comemos mais um sanduíche cada um e ficamos ali parados, hipnotizados enquanto ela começava a virar as rabanadas. Cada um então pegou um prato e ficamos em pé do lado dela. Ela tirou as rabanadas do óleo borbulhante com um pegador e serviu os nacos dourados e redondos em nossos pratos. Nós agradecemos. Ela botou sal e pimenta na carne. Despejou uma lata de tomates e outra de feijão. Continuamos em pé ali, com nossos pratos estendidos. Ela serviu grandes porções da mistura de carne em cima dos pães fritos. Na mesa, havia um bloco do queijo subsidiado pelo governo. Estava congelado, o que facilitava na hora de cobrir a carne com ele. A fome era tanta que nos sentamos na mesa mesmo. Zack e Angus estavam do lado de fora das portas deslizantes, no pátio. Ela preparou os tacos índios para eles, como os nossos, e os chamou para dentro. Eles se sentaram no sofá e comeram.

Por um bom tempo, ninguém disse nada. Apenas comíamos e comíamos. Vovó cantarolava enquanto cozinhava no fogão. Era pequena e magra, sempre com um vestido florido em tons pastel, meias vermelhas enroladas para baixo como se fosse um toque fashion, e mocassins feitos por ela mesma, de couro de veado. As duas tias de Cappy curtiam peles de animais em seus quintais. Os quintais fediam, mas as peles ficavam perfeitas. Todos os verões, davam uma camurça macia para vovó. Seus mocassins eram enfeitados com pequenas flores cor-de-rosa. Ela prendia os longos cabelos finos e brancos num barrete e usava brincos de conchas brancas. Mantinha uma expressão desdenhosa e astuta no rosto, os olhos eram duas pequenas bolinhas negras e penetrantes. O olhar jamais era doce ou afetuoso, mas sempre alerta e frio. Isso pode parecer estranho em alguém que cozinhava para os garotos. Mas, enfim, ela sobrevivera a diversas mortes e outras perdas e não lhe sobravam sentimentos. À medida que nos entupíamos, comíamos mais devagar. Todos queríamos terminar exatamente ao mesmo tempo, comer e ir embora. Mas vovó Thunder iniciou uma segunda rodada e começamos tudo de novo, comendo ainda mais devagar agora, e ainda mudos. Quando terminei, agradeci e levei meu prato para a pia. Eu já ia dizer que precisava ir para casa quando a sra. Bijiu entrou, sem bater. A pior de todas. Uma mulher gorducha, agitada e barulhenta, imediatamente sentou na minha cadeira e disse: Aaaaaaaaaah!

A Casa Redonda
Louise Erdrich
2012
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Louise Erdrich é uma escritora americana conhecida por suas obras que exploram a cultura e a história dos nativos americanos. Ela nasceu em 1954 em Little Falls, Minnesota, e é de ascendência chippewa (ou ojibwe), uma tribo nativa americana. Erdrich estudou escrita criativa na Universidade de Johns Hopkins e publicou seu primeiro livro, "Love Medicine", em 1984, que ganhou o National Book Critics Circle Award. "A Casa Redonda" é um romance de Erdrich publicado em 2012, que conta a história de uma mulher chamada Joe Coutts, que vive na reserva indígena Turtle Mountain, em Dakota do Norte. Quando Joe tem 13 anos, ela é violentamente atacada e estuprada, o que a leva a refletir sobre sua identidade e conexão com sua cultura e comunidade. O livro também explora temas como justiça, família, tradição e resiliência. Erdrich utiliza uma narrativa multifacetada e complexa para contar a história de Joe e de sua família, incluindo flashbacks, memórias e histórias interconectadas. Ela também incorpora elementos de realismo mágico em sua escrita, adicionando uma dimensão mística e poética ao livro. "A Casa Redonda" foi aclamado pela crítica e foi um dos finalistas do National Book Award de 2012. Ele também ganhou o Prêmio Nacional da Livraria Independente para Ficção em 2013. A obra é uma contribuição significativa para a literatura americana contemporânea e uma reflexão poderosa sobre a experiência dos nativos americanos na sociedade moderna.