Em camadas distintas e separadas
A partir disso é inevitável que se pergunte quais as relações entre esses diferentes modos de existir. O que há em comum entre vida e química, entre bem e mal e cargas elétricas; entre um conjunto de células e a consciência de uma carícia. É neste ponto que os abismos começam a se abrir. Porque não há nenhuma conexão visível. O universo repousa no topo dele próprio, em camadas distintas e separadas.
— Como um sorvete napolitano — a mente de Mary voou imediatamente para essa fantástica e inesperada comparação. “Esta escritora jovem e espirituosa...” Isso já estava escrito na contracapa de seu livro.
Calamy riu.
— Sim — concordou —, como um sorvete napolitano. O que é verdadeiro para a camada de chocolate, na base do sorvete, pode não valer para a última camada de baunilha. E uma verdade para o sorvete de limão é diferente da que o é para o sorvete de morango. E cada um deles tem tanto direito de existir e de se considerar real quanto todos os outros. Certamente não se pode explicar um em termos dos outros, como a baunilha em termos de quaisquer das outras camadas inferiores. Não se explica a mente como mera vida, química ou física. Essa é a única coisa perfeitamente clara e evidente.
— É claro — concordou Mary. — E qual é o resultado de tudo isso? Realmente não consigo perceber.
— Nem eu — disse Calamy, com uma explosão melancólica de riso. — A única esperança é que, se continuarmos a pensar com firmeza e por muito tempo, talvez possamos chegar a uma explicação do chocolate, do limão, do morango e da baunilha. Quem sabe seja tudo baunilha, tudo mente ou tudo espírito. O resto será só aparência, só ilusão. Mas ninguém pode afirmar uma coisa dessas se não estiver livre para pensar muito.