Sobre a limpeza na cozinha - Marian Keyes

Coisas de cozinha

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Uma cozinha absurdamente suja. Panelas e potes e pratos empilhados perigosamente na pia, de molho em água parada; o chão parece não ver a cor de um esfregão há séculos, e respingos de comida velha decoram o tampo do fogão, como se uma gangue de pintores action paint tivesse passado por ali recentemente. Dois homens, jovens e musculosos, estão encostados na mesa da cozinha, falando polonês.

Os rostos estão próximos e a conversa é urgente, quase assustada. Ambos estão tomados de angústia, tanto que a vibração está confusa, não consigo diferenciar e distinguir uma da outra. Por sorte, descubro que sou fluente em polonês e aí vai uma tradução tosca do que eles estão dizendo:

— Jan, você fala para ela.

— Não, Andrei, fala você.

— Eu tentei, da última vez.

— Andrei, ela respeita você mais.

— Não é verdade, Jan. Por mais difícil que seja eu entender isso, que sou polonês, ela não respeita nenhum de nós dois. Mulheres irlandesas estão muito além da minha compreensão.

— Andrei, você fala e eu faço três repolhos recheados para você.

— Quatro, e não se fala mais nisso.

(Acho que inventei as duas últimas frases.)

Adentra a cozinha o objeto da discussão, e não consigo enxergar de que eles têm tanto medo, dois caras grandes como eles, tatuados e de cabeça raspada. Essa pequena criatura — irlandesa, diferentemente dos dois rapazes — é adorável. Uma mocinha linda, de olhos maliciosos, cílios compridos e cabelos cacheados até os ombros. Vinte e poucos anos, é o quanto aparenta, e exalando uma energia tão entusiasmante que suas vibrações podem ser sentidas no ar.

Na mão, carrega o jantar semipronto. Uma refeição de aspecto terrível. (Rosbife esverdeado, caso você esteja interessado.)

— Vai — sussurra Jan para Andrei.

— Lydia — Andrei gesticula em direção à cozinha francamente imunda. Em inglês, ele diz: — Você limpa, de vez em quando.

— De vez em quando — diz ela, pegando um garfo no escorredor de pratos. — Infelizmente, não nesta vida. Agora, vaza.

Com vivacidade, Andrei abre caminho para que Lydia chegue até o micro-ondas. Maliciosa, ela fura com garfo o papel celofane que cobre a comida. Quatro vezes, cada espetada fazendo o barulho de uma pequena explosão, alto o suficiente para que Jan pisque o olho esquerdo, e então Lydia joga a embalagem dentro do micro. Aproveito a oportunidade para me colocar atrás dela e me apresentar, mas, para minha surpresa, ela faz um gesto e me espanta como se eu fosse uma mosca.

Euzinha!

Você não sabe quem eu sou?

Andrei faz uma nova tentativa. — Lydia, por favor... O Jan e eu, a gente limpa o tempo todo.

— Parabéns. — Resposta rápida de Lydia, que encontra a faca com aparência menos imunda no lodaçal da pia e passa uma água no objeto por meio segundo.

— A gente fez uma escala. — Delicadamente, Andrei acena para ela com um pedaço de papel.

— Parabéns de novo. — Ah, como os dentes dela são brancos, que sorriso lindo!

— Você mora aqui há três semanas. Nunca limpou nada. Tem que limpar.

Uma emoção inesperada irradia de Lydia, negra e amarga. Aparentemente, ela limpa, sim. Mas não aqui? Onde, então?

— Andrei, meu repolhinho polonês, e você também, Jan, meu outro repolhinho polonês, vamos imaginar que a situação fosse exatamente inversa. — Ela balança a (ainda suja) faca para enfatizar o que diz. De fato, sei que existem duzentos e setenta e três tipos diferentes de bactérias florescendo naquela faca. Mas, também sei agora, que seria preciso ser a bactéria mais corajosa e mais heroica para se dar bem com essa Lydia.

— Situação exatamente inversa? — pergunta Andrei, ansioso.

— Digamos que fossem duas mulheres e um homem morando nesse apartamento. O homem nunca faria nada. As mulheres fariam tudo. Não fariam?

O micro-ondas apita. Com um sorriso sedutor, Lydia tira de dentro dele seu jantar nada apetitoso e sai da cozinha para ver alguma coisa na internet.

Que madame mimada! Que figurinha deliciosamente rebelde.

— Ela chamou a gente de repolhinho — disse Jan, petrificado.

— Odeio quando ela chama a gente de repolhinho.

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A Estrela Mais Brilhante do Céu
Marian Keyes
2009

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Marian Keyes é uma escritora irlandesa conhecida por seus romances engraçados e emocionantes que tratam de temas como amor, família, amizade e superação. Ela começou sua carreira escrevendo contos, mas logo passou a se dedicar aos romances, que se tornaram best-sellers em todo o mundo. Seu livro "A Estrela Mais Brilhante do Céu", publicado em 2009, é um dos mais populares de sua carreira. A obra conta a história de um grupo de personagens que moram em um prédio em Dublin, na Irlanda, e cujas vidas se entrelaçam de maneira surpreendente. Entre eles, estão uma idosa que acredita ser perseguida por um anjo, um casal que está se separando, uma jovem que tenta superar um trauma do passado e um homem que esconde um segredo. "A Estrela Mais Brilhante do Céu" é um livro divertido e emocionante, que trata de temas profundos de maneira leve e acessível. A escrita de Marian Keyes é ágil e bem-humorada, e seus personagens são complexos e cativantes, o que torna a leitura envolvente e prazerosa. Além de "A Estrela Mais Brilhante do Céu", Marian Keyes é autora de outros romances populares como "Melancia", "Férias!" e "Cheio de Charme". Sua obra é um retrato fiel da sociedade contemporânea e uma reflexão sobre os desafios e as alegrias de se viver em um mundo cada vez mais complexo.