Pão Francês de Buenos Aires - Julio Cortázar


O Jogo da Amarelinha
Julio Cortázar
1968
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— Sim, por volta das três da manhã. Sonhei que ia à cozinha, cortar uma fatia de pão. Era um pão diferente daquele que temos aqui, era pão francês como os que existem em Buenos Aires, entende, que nada têm de franceses, mas que se chamam pães franceses. Imagine você que é um pão mais grosso, de cor clara, com muito miolo. Um pão para comer com manteiga e doce. Compreende?

— Sim, já sei — respondeu Etienne. — Já comi desses pães na Itália.

— Você está louco. Não se parecem em nada com os pães italianos. Um dia, prometo, ainda lhe farei um desenho para que entenda como são os pães de Buenos Aires. Escute, têm a forma de um peixe largo e curto, apenas quinze centímetros, mas bem mais gordo no meio. É o pão francês de Buenos Aires.

— O pão francês de Buenos Aires — repetiu Etienne.

— Sim, mas isso me aconteceu na cozinha da Rue de la Tombe Issoire, antes de eu ter ido morar com a Maga. Estava com fome e cortei uma fatia desse pão. Então, ouvi que o pão chorava. Sim, é claro que se tratava de um sonho, mas o pão chorava sempre que eu lhe metia a faca. Um pão francês qualquer e chorava. Acordei sem saber o que ia acontecer, cheguei mesmo a pensar que ainda tinha a faca cravada no pão quando acordei.

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Julio Cortázar foi um escritor argentino nascido em 1914 e é considerado uma figura proeminente na literatura latino-americana do século XX. Sua obra mais famosa é "O Jogo da Amarelinha", publicada em 1963, é um romance inovador que desafia as convenções narrativas tradicionais. Sua estrutura é não linear, e o leitor pode escolher entre seguir a ordem tradicional dos capítulos ou adotar uma abordagem mais experimental, saltando entre os capítulos conforme sugerido pelo autor.